segunda-feira, 19 de maio de 2014

Texto Informativo: Primeira Jornada Universitária em defesa da Reforma Agrária – JURA



A Primeira Jornada Universitária em defesa da Reforma Agrária – JURA, ocorrida em 10 de abril de 2014 na Universidade Federal de Goiás – Campus Cidade de Goiás e promovida pelo Curso de Pós-Graduação em Direitos Sociais do Campo- Residência Agrária, contou com a participação de dois grandes representantes dos movimentos sociais do campo, Maria Delícia e Jeová Porfírio, filhos de José Porfírio, líder camponês e político, integrante principal da Revolta Camponesa de Trombas e Formoso ocorrida na década de 1950 no Estado de Goiás. Contou, também, com a participação do Prof. Dr. Romualdo Pessoa Campos Filho, docente no Instituto de Estudos Sócio-Ambientais – UFG, que discorreu e debateu sobre a Guerrilha do Araguaia, tema de seu mestrado e doutorado. 

A Jornada trouxe à comunidade acadêmica um novo pensar, um diálogo onde se discutiu assuntos importantes e marcantes que se encontram às margens das percepções sociais como, por exemplo, as lutas camponesas alvo de descaso por parte do Estado. A Jornada teve início com a exibição do documentário "Cadê Profiro?", produzido pelo DocTV (Programa de Fomento à Produção e Teledifusão do Documentário Brasileiro) com apoio do Ministério da Cultura, e dirigido por Hélio Brito, que mostra a trajetória de vida do tocantino José Porfírio, contada por familiares, por pessoas que conviveram com ele e que também participaram da Revolta Camponesa de Trombas e Formoso.

José Porfírio mudou- se, na década de 1940, de Tocantins para Goiás em busca de terras, e chegando ao seu destino, encontrou uma região totalmente ocupada. Então, Porfírio e sua família foram para Uruaçu, onde se localizavam os povoados de Trombas e Formoso. Na década de 1950 a região se expandiu e começou a chamar a atenção de grileiros, que recebiam o apoio das autoridades locais e estaduais para expulsar os camponeses que já habitavam as terras, utilizando atos violentos, ameaças e assassinatos para alcançar seu objetivo. Porfírio tornou- se líder do grupo de camponeses e mais tarde aliou-se ao partido comunista, sendo o primeiro camponês a se candidatar e ser eleito deputado. Com essa conquista, a região de Trombas e Formoso teve seus avanços e os posseiros receberam os títulos de suas terras até serem vítimas do golpe de estado que instalou a ditadura. A partir de então, os posseiros viveram um momento de retrocesso, seus títulos de terras foram revogados e José Porfírio teve o seu mandato cassado. Após um longo período de refúgio e sobrevivência, Porfírio é capturado, preso, solto e, por fim, torna- se um desaparecido político.

Após a exibição do filme, os filhos de Porfírio relataram e relembraram a história de luta de seu pai, essa figura ilustre do movimento camponês, que foi interlocutor dos campesinos junto às autoridades estaduais e encabeçou uma luta que se tornou resistente e ganhou força no campo político. Maria Delícia e Jeová Porfírio, pessoas de uma humildade e carisma admiráveis, transmitiram através de suas falas a triste realidade de luta pela sobrevivência que viveram, cercados por constantes ameaças e reféns de uma vida de fugas, medos e perdas. Perda de suas terras, de seus familiares e de sua própria história. Eles relataram como foi viver uma ditadura e subsisti-la superando, a cada dia, todos os rastros deixados por ela, quais sejam a privação do convívio com os pais, do desfrutar da infância, da possibilidade de ter a família reunida e da oportunidade de estudar e de construir um futuro melhor, direitos estes que lhes foram roubados.

Após a fala dos filhos de Porfírio, a palavra passou ao Prof. Dr. Romualdo Pessoa, que discorreu sobre a Guerrilha do Araguaia e a importância de falar e relembrar os movimentos de luta pela terra, de fazê- los, mesmo que há muito ocorridos, presentes e vivos nos dias de hoje. Romualdo falou sobre a Guerrilha do Araguaia, uma batalha desigual entre combatentes revolucionários e as forças de repressão do regime reacionário imposto ao país com o golpe de 1964. A Guerrilha aconteceu em meados da década de 1970 em território amazônico, mas estendeu- se até os estados de Goiás, Pará e Maranhão, e foi criada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), tendo por objetivo fomentar uma revolução socialista, a ser iniciada no campo, baseada na experiência vitoriosa da Revolução Cubana. Por fim, o encontro abriu espaço para um debate com Romualdo a respeito da Guerrilha e para perguntas direcionadas a todos os participantes da mesa. 

A Jornada veio com o intuito de reforçar a representatividade dos movimentos sociais do campo, que buscam a democratização de posse pela terra e a reparação de injustiças sofridas por estes povos do campo, os quais estão em constante luta pela reforma agrária, melhoria das condições de trabalho e pelo combate da substituição do homem pela máquina. Para realizar tal intuito, contou- se com a presença de exemplos vivos dessa realidade: os filhos de José Porfírio, camponês que deu o próprio sangue na luta pelo reconhecimento dos direitos da sua classe, os quais sentiram na pele as consequências de tal luta. E com a presença de um Mestre e Doutor na Guerrilha do Araguaia, memorável luta pela liberdade e pela democracia em nossa pátria. Exemplos estes, que nos deixaram uma reflexão: Qual a verdadeira função social da terra? A grande provedora das necessidades humanas, da qual todos os povos tiram o seu sustento, sua alegria, seu vestuário e sua arte.

Segundo o Estatuto da Terra, Lei n.° 4.504, de 30 de novembro de 1964, primeira lei brasileira que adotou a função social como paradigma para a qualificação da propriedade, “a propriedade da terra desempenha integralmente sua função social quando: favorece o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; mantém aproveitamento racional e adequado; assegura a conservação dos recursos naturais; observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivam.” Mas, independente do que digam as leis, a terra serve, funciona e tem vida, para dar vida, para reproduzir a vida, não de cada indivíduo isoladamente, mas de todos os seus habitantes, plantas, animais ou humanos. Portanto, sua função é manter a vida nas suas mais diversas formas e em suas mais estranhas e improváveis mudanças. A terra tem como principal e/ou única função social prover a vida.

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